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Cyberproseamento


Texto publicado por Jean-Frédéric Pluvinage, diretor da FoxTablet, na Revista da Acadil 2020

— Ser caipira é ser cyberpunk!
E foi assim que Merrypain virou o seu copo. De sopetão. Transformava seu costumeiro bar em sarau filosófico. Misturava antropolítica com álcool, e se embebedava com ambos. Ora, se não existe racionalidade nos fatos sociais, então estudar nosso modo de vida exige dela uma pinga cabocla e um paieiro artesanal ao som de sintetizadores.
— Eita menina, já tá sapecada antes de molhar o bico.
— Tô não, compadre!
— Que história é essa então? Caipira é caipira!
Beba sempre a fonte das estórias, ela respondeu — com mais um gole. Donde vem o caipira? Lá quando os portugueses invadem as terras dos indigenas, e se instalam por aqui, têm filhos por aqui. Esses filhos vivem entre dois mundos… O lado do pai, um desregrado que se amarujou pra longe da sua terra, viajante ambicioso que ainda se fardeia com sua tradição. O lado da mãe, nativa de um mundo gerado por contos orais, ritos e danças que se passam pela memória. Cada um tem seu sistema, seu código cheio de tags. Para um é o nazareno, para outro é a mãe lua. <Família>? <Comunidade>? <Trabalho>? Tudo aplicado de forma diferente. As vezes uma tag nem existe no outro código… Como explicar <pecado> a um indígena? Não é possível atualizar seu HD sem instalar <culpa> antes. E assim temos o choque, dois códigos próprios que fazem sentido dentro de seu respectivo sistema, mas que mal se conversam. Só uma troca de bits, um espelhinho aqui por um cocar de penas ali… Tudo quebrantado, um baita server desenxavido e lento que nossa, até que…
O som de punk rock sertanejo explode das caixas e interrompe a prosa. Ela aproveita e vira mais um copo. O dono do bar, metido a DJ, ajusta o som e logo separa mais uma garrafa para a Merrypain. Ela vai precisar — sua tese frankesfreyriana vivia de eletricidade com cana fermentada.
— Até que os filhos se tornam hackers, integram os dois códigos, remixam as linguagens. Nós os caipiras! À margem das capitais, mas numa aldeia cada vez mais conectada. Resta saber como nossas tags serão atualizadas presses novos tempos. Compadre, a vida é um eterno update

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